segunda-feira, 14 de maio de 2018
...ninguém me disse...
Éramos muitos lá em casa..e como tal aprendi a ver a mãe a comprar tudo em quantidades grandes, a cozinhar grandes panelas de sopa, ou grandes tachos de outra comidinha boa. Claro que ,quando casei, o que eu sabia cozinhar era em quantidade...e por isso andávamos a comer a mesma coisa durante dias para não se estragar. Ninguém me disse que seria assim...
Fazer compras era outra aventura...habituada que estava a comprar 5 pacotes disto e mais 5 litros daquilo, 10 de uma coisa e 7 de outra...custou me habituar a comprar 1 ou 2 embalagens de cada...Éramos 2, não 11. Também ninguém me disse que isso iria acontecer.
Ninguém me disse que estudar fora de casa, em regime de internato, seria tão complicado como foi. Partilhar quarto com pessoas de culturas e educação diferentes não me foi fácil. Estar longe da família, da casa foi muitas vezes regado com lágrimas. Não havia net... o telefone era bem pago e as viagens não eram baratas para quem não ganhava nada.
Ninguém me disse que os namoros eram difíceis...que nem todos os dias recebíamos flores, que não respirávamos corações como nos desenhos animados, nem suspirávamos sempre que olhávamos um para o outro como nos filmes.
Também ninguém me disse que o casamento não era um completo romance 24 sobre 7 , que por vezes havia dias maus, que eu tinha que fazer cedências, andar até meio do caminho...porque eu acreditava que comigo seria diferente.
E quando vieram os filhos, também não sabia que havia um explodir de amor por outra criaturinha, que nos apaixonaríamos por aquele ser que nunca antes tinhamos visto, que era tão bom sentir aqueles pontapés e pequeninos empurrões dentro da barriga. Nunca me tinham dito.
E quando as coisas não sucederam como nos contos de fadas, também ninguém me disse que continuaria a lutar, com as forças que surgiram sei lá de onde, que continuaria a amar para além das limitações, dos desaires, das desilusões, que eu seria capaz...e fui.
E quando toda a gente dizia como eu havia de cuidar dos meus filhotes, apesar de todas as "mézinhas que me disseram que devia usar, de todas as comidinhas que eu deveria dar, de todos os choros que eu devia deixar chorar...aí eu não precisei que me dissessem mais nada...eu e só eu sabia o que havia de fazer, de amar , de cuidar, de dar colo. O colo era meu...e só meu...e não me arrependo de nem um minuto sequer em que abracei os meus filhos . Nunca vou esquecer a mãozinha em cima do meu peito, os dedinhos a enrolarem se nos meus cabelos, o respirar fundo quando os apertava contra mim.
Há coisas que não precisamos que nos digam,porque há coisas que só nós sabemos...e sentimos...e passamos na pele. Lembro me da minha mãe, de como tantas vezes ela dizia "Oh filha, a mãe não tem fome. Já comi esta sopa toda, vês ? " E eu, criança, acreditava ...depois questionava me porque é que a mãe "perdia o apetite" sempre a seguir à sopa...Até que uma dia eu também disse à minha filha a mesma coisa "A mãe não tem fome...vês ? Já comi tanta sopa."...e aí já não precisei que me dissessem o porquê da resposta da minha mãe.
Não é preciso dizerem-nos tudo...a vida encarregar-se-à disso.
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Há coisas que sabemos porque sentimos e vivemos.
ResponderExcluirGosto de te ler e sentir com as tuas palavras os meus próprios sentires. <3
Texto magnífico Elisa! Experiência de vida,sim mas também muita sensibilidade! Obrigada por esta partilha! Não lhe conhecia esta faceta! Verdadeiramente, de formas diversas, a Elisa está ao serviço dos outros❤
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